Quero morrer nos seus braços

Giovani Iemini
(Mão Branca)



Baseado na música: Nos braços da Vampira
de Zumbis do Espaço

Vento gelado. O luar rasgou a noite como uma espada de luz ao surgir do ventre de negras nuvens. Germano estranhou a curvilínea mulher que quase flutuava. Os seios fartos, os cabelos esvoaçantes e a brancura mórbida da pele chamaram mais sua atenção que o calafrio solitário na espinha.

Ela sorriu. As presas reluzentes e ameaçadoras assustariam qualquer pessoa, porém o rapaz sentiu apenas impaciência, uma sensação de falta de tempo, como se findassem todos os temores e preocupações. A inusitada situação deveria atormentá-lo, contudo, mal podia compreender o que acontecia. Os pensamentos se concentravam na mulher à sua frente. Já sofria os feromônios da vampira, que lhe afetavam o discernimento provocando uma urgente atração por ela.

- quero sentir o seu corpo. – Escutou a própria voz sussurrando, quase implorando, enquanto recebia o gélido abraço que o confortava como a morte aos moribundos. O hálito de predador, ardido e podre, não combinava com aqueles lábios suculentos, um encantador sorriso de prazer e sedução. – seus dentes no meu pescoço.

Ela atacou voraz, fincou os caninos na jugular pulsante, profundamente, até ejacular o fluído vital, o néctar rubro que a alimentava. Sentiu a energia escorrer pela garganta, uma overdose de heroína, orgasmos em todas as células, a percepção da transcendência amaldiçoada que permitia roubar a essência dos outros para perpetuar sua vida. Ou meia-vida.

Germano sentiu, brevemente, os pensamentos da vampira, no momento em que ela sorriu pelo prazer da caça:

"Nossos sangues se encontram
As trevas nos esperam"

Ele sofria como se um incêndio se alastrasse pelo pescoço, queimando e apodrecendo parte por parte as veias, daí a carne e depois de todo o corpo. Era como se morresse, contudo, não tranqüilizasse a alma, a podridão alcançava algo mais profundo, sua essência era transformada pela maldição daquele monstro que o assassinara. Um espasmo final arrancou a última esperança, ele viu que não pertencia mais ao mundo dos mortais.

- quero estar sempre ao seu lado. – Os sentidos de vampiro afogaram Germano com flashes de visões, cheiros e pensamentos. A miríade de novas experiências, de possibilidades inimaginadas, o atordoou, e o atraiu como nunca pode imaginar. A visão perdeu o foco, atingiu um ponto distante no futuro, fazendo-o perceber todo o poder daqueles seres. Era uma sensação maravilhosa de prazer sem risco, mas também sem emoção. – quero ser o seu escravo, vampira.

Ele não se importava mais com nada. Só suplicava, íntimo, alcançar a vida eterna como um servo daquela atraente mulher. Os flashes se tornaram mais coerentes, ele viu que compartilhava os pensamentos da mestra. Foi puxado por um turbilhão de imagens, flutuou até encarar um rosto gigantesco da vampira. Sobrancelhas inclinadas numa bela face pálida emolduravam olhos injetados que o convidavam a conhecer seus mistérios, eram como portais para o orbe esquecido de sua espécie. Germano os atravessou, inebriado, e se descobriu num mundo em pedaços. Por todos os lados havia túmulos violados, em que antigos vampiros sugavam os cadáveres até os ossos, buscando o último resquício de energia vital.

A visão tremelicava em sua mente, ele sentia aquela fome absurda por sangue, os sentidos, ampliados, facilitavam a compreensão do que a mulher queria lhe transmitir. "Se todos os infeccionados se transformarem, logo este mundo será como aquele de onde vim".

- você veio do espaço, vampira. – Ele balbuciou. Placidamente aceitava o terrível destino. A revelação o tranqüilizava, até o excitava, entendia a irrefreável compulsão da vampira, a solidão de suas necessidades. O breve momento que compartilhou daquela mente alienígena quase validava o que lhe acontecia. Sua vida era encerrada da forma mais sensual que ele agora podia imaginar. – quero morrer em seus braços, vampira.